segunda-feira, maio 09, 2022

Aborto: desfazer o nó górdio

O aborto será o nó górdio das sociedades ocidentais?

Talvez…

Talvez, como o célebre nó, quem o desfizer, venha a dominar o mundo… E, talvez, ainda, ele se desfaça de uma forma inesperada. Lancemos, por isso, a espada sobre a corda, à maneira de Alexandre Magno, e vejamos como, afinal, de modo simples, se detém no chão o liame que parecia ser invencível…

Não sei, ainda, se o desfazer do laço nos dará o domínio sobre o mundo, mas estou certo de que nos enredos da corda se enunciam muitos dos problemas com que se depara a nossa sociedade contemporânea.

A base da nossa sociedade não é o indivíduo, mas a relação. Se duvidamos, basta que vejamos com atenção como as decisões fundamentais não nos pressupõem, primeiro, indivíduos, mas sim seres relacionais. Para que serviria, afinal, ter uma língua oficial se não fosse para a partilhar e, em torno dela, nos unirmos? Para que serviria um hino nacional se não fosse para o darmos a ouvir e nos unirmos em torno dele com emoção e, quantas vezes, comoção?

Para que serviria obrigarem-nos à partilha do que ganhamos, através de impostos, se não fosse para nos valermos uns aos outros, mesmos aos que nunca conheceremos?

Para que serviria reconhecer associações e organizações ou a família como base da sociedade se não fosse sob o pressuposto de que somos seres que se definem na relação?

Por influência, porém, de uma visão liberal de matriz estritamente individualista, temos sido convencidos de que, entre Estado e indivíduo, nada existe…

E, ainda que assim fosse, a discussão sobre o aborto esquivar-se-ia a estes pressupostos pela razão que passarei a descrever.

Um homem e uma mulher que se envolvem num momento denso de afetividade e sensualidade são, ainda, um homem e uma mulher… A partir, porém, que da sua relação começou a gerar-se um novo ser, eles deixaram de ser apenas um homem e uma mulher. O que eram ganha nova densidade em virtude de um novo ser que os une, de modo indefetível e que, quer queiram, quer não, os unirá para sempre. Mesmo que ousem fazer de conta que não é assim.

Claro que muitos dirão que esta leitura é reacionária. Mas é curioso que se há algo de reacionário nisto é à dura realidade que o teremos de atribuir.

A partir do momento em que um humano está em gestação, aquele homem e aquela mulher já não serão, apenas, aquele homem e aquela mulher: passarão a ser, para sempre, o pai e a mãe daquele ser.

Mesmo que ousem nunca lhe dar um nome ou permitir que mostre o rosto que, desde a primeira hora, se prenuncia.

O pai e a mãe deste novo ser humano em gestação são-no em virtude dele e as suas vidas estarão, inelutavelmente, unidas.

A gestação deste novo ser cria uma nova realidade que, sendo, primeiramente, uma realidade de natureza biológica (aquele ser humano é filho deste pai e desta mãe e a genética o demonstra sem ideologias e de forma objetiva…), deveria ser, desde a primeira, hora, uma nova realidade jurídica.

Aquele homem e aquela mulher passam, a partir deste momento, a ser pai e mãe e, numa sociedade honesta, deveriam passar a ter deveres de cuidado para com aquele igual a todos nós que está, agora, a fazer-se gente e que, não antes dos seus três anos de idade, pouca consciência terá de si mesmo se não lho permitirem os demais humanos em seu redor.

É verdade - como reconheceram os abortistas que logo rasgaram as vestes quando se afigurou a possibilidade de que a história do caso Roe vs Wade se pudesse alterar (esta que é uma infeliz história de mentira e perjúrio – seja-se honesto e diga-se que a legalização do aborto, no ocidente, assentou em fake news…) - que a legislação sobre o aborto mostra a saúde democrática das nossas sociedades. Ela mostra se, de facto, os direitos de quem tem poder se sobrepõem à voz dos que não a têm porque lha impedem de vir a ter.

Um embrião ou um feto humanos é um de nós; são nós na sua/nossa primeira etapa da vida. E se é certo que se protege uma ave desde a fase do ninho, como pode pretender-se proteger um humano apenas quando ele já pode defender-se e gritar?

Voltemos atrás…

Como poderia aceitar-se que o filho fosse ‘direito’ de apenas um dos dois, pai ou mãe?

Em primeiro lugar, o filho não é um bem a que alguém tenha direito. O filho é filho. Ponto!

Cabe-nos ajudá-lo a fazer-se gente! Cuidar e cuidar e… após tudo isso, cuidar!

Se o aborto viesse a ser um direito (convém que se reconheça que, até Macron, poucos tinham sido os que afirmavam que fosse direito. Sempre se situara no âmbito da despenalização. Hoje, pretende-se considerar como direito…), os direitos de um só (a mulher; não a mãe!) prevaleceriam, de forma absoluta, sobre os direitos de dois outros: o filho e o pai.

Valerá a pena perguntar a que título passaria a estar, ao lado da parturiente, o pai: por especial concessão da mulher que determinaria que este seria o pai?

Mas o filho de que ele é pai não foi gerado no momento do nascimento, mas no primeiro momento, o da conceção!

Só por pura arbitrariedade de um legislador ‘arbitrário’ (passe a redundância) é que se pretenderia legitimar tal coisa. A realidade do filho gera o pai e a mãe no momento da sua conceção. As vidas destes três seres unem-se nesse momento. Não noutro qualquer.

Assim o determina a natureza das coisas.

Só por ideologia ou por motivos obscuros pode pretender-se que seja de outro modo.

O nó górdio desfar-se-á no dia em que, definitivamente, houver coragem para reconhecer a personalidade jurídica do ser humano em gestação, exigindo-se deveres de cuidado dos respetivos pai, mãe e sociedade que se deverá reconhecer na vida em crescimento. De outro modo, a arbitrariedade sobre quando é que uma mãe é mãe ou um pai é pai será nascente de conflitos e favorecerá litígios desnecessários.

Como poderá esperar-se a construção de uma sociedade pacífica que assenta na legitimação da violência da mãe sobre o seu próprio filho? O aborto mata o filho e, com ele, mata a mãe. Fica uma mulher em conflito consigo e com os que a rodeiam….


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