Maio é um mês cheio de sinais que desafiam a olhar
para o essencial: é o mês do coração, o mês da Mãe, o mês de Fátima, o mês da
Vida.
Este pretexto serve-me de mote para recuperar
memórias de tempos em que outras crises desafiaram a encontrar rumos.
Recuo a 1998. Nesse ano, Portugal efervescia,
diante da iminência do primeiro referendo nacional, a realizar em 28 de junho,
dedicado ao tema «aborto». Nesse mesmo ano, Portugal voltaria a ser chamado
para se pronunciar em referendo, mas já sobre a regionalização, em novembro do
mesmo ano. Sobre esta última matéria, não voltaria a surgir novo momento para
pronunciamento popular. Já sobre o aborto, a insistência em que esta seria
matéria «de progresso» fez com que se regressasse ao assunto em 11 de fevereiro
de 2007.
A história é por todos conhecida, servindo,
seguramente, no futuro, de pretexto para estudos sobre como se manipulam as
consciências no sentido de demonstrar que o inadmissível possa tornar-se aceitável.
Mas não é, por agora, o núcleo em que encontrarei um modelo de como proceder
para superar uma crise.
Regressemos a 1998.
O país efervescia. De um lado, os que defendiam que
a liberdade de abortar era um direito da mulher; de outro, os que sustentavam
que nada podia legitimar a morte dos indefesos. Então, como hoje, eu estava do
segundo lado, certo de ser a posição em que ninguém perdia. Então, como hoje,
estava convicto de que o outro lado defendia um contra outro, a mãe contra o
filho.
Mas, nesses tempos, os que se encontravam do mesmo
lado em que eu me situava, verificaram que a sua posição apresentava uma
aparente fragilidade. Era magra a resposta que se tinha para dar às mulheres
que se sentiam vítimas de pressões para abortar: não tinham, ou não sabiam, a
quem recorrer para evitar o que não pretendiam.
Apesar de o aborto, como qualquer morte provocada
de um inocente, ser, antes de tudo, matéria de ética e de moral, esta
fragilidade não deixou de constituir um desafio e de provocar uma crise que exigia
resposta a todos os que reconheciam que a vida vale todos os esforços.
O referendo realizou-se, vencendo, então, o «não».
Para muitos, para os que consideram que o mundo é só
aquilo de que falam os meios de comunicação social, a partir dessa data não
houve mais nada até 2007. A realidade, porém, foi outra. A partir dessa data,
começou, em Portugal, toda uma onda de resposta ao drama do aborto, surgindo,
um pouco por todo o país, associações e outras instituições que vêm
assegurando, desde então, respostas estruturadas para as mulheres e famílias
que necessitam de apoio para que os seus filhos possam nascer.
Essa onda, que uniu esforços para que se
encontrassem respostas que o Estado teimava em não dar, esteve na origem de um
movimento de que nasceu a ADAV-Aveiro, fundada em 21 de julho de 2000, como
fruto da união de esforços de 30 pessoas, entre as quais eu próprio me contava,
e a quem outras se associaram. Pessoas que entendiam que essa era a hora de
responder a um desafio que o Estado fazia de conta que não existia. A
associação nasceu, cresceu, vendo reconhecido, a partir de 2004, o seu estatuto
de IPSS. Hoje, em cada ano, a ADAV-Aveiro acompanha mais de 100 famílias, e assegura
condições para que, por ano, várias dezenas de crianças possam nascer, auxiliando-as
nos primeiros anos de vida.
Tendo sede em Aveiro, a ADAV acompanha famílias de
todo o distrito. Conta com pouco mais de 100 sócios e alguns benfeitores, sendo
uma associação que presta todo o apoio com recurso a voluntários e graças à
generosidade de todos os que reconhecem nesta uma verdadeira causa nobre.
Na origem desta associação, reserva-se uma mensagem
para todos os tempos de crise: quando o desafio está diante dos nossos olhos,
não há que desviar o olhar, mas ver por onde é o caminho que atravessa a crise.
Então, como hoje, não há que esperar que sejam os
outros a responder, mas aceitar que a crise
é o crisol em que se purifica o ouro.
Pode ser dura, mas se não nos acomodarmos, saberemos sair reforçados.
Luís Silva
Presidente da direção da ADAV-Aveiro